Jurassic World: Recomeço (2025), dirigido por Gareth Edwards, é uma produção que beira o desastroso apesar de milhões investidos.
Desde o início, fica cristalino que o roteiro mais lembra um exercício acadêmico mal executado por um calouro que ainda soltava gírias como “só lendo o Manual do Roteiro do Syd Field” e tentando montar suas primeiras páginas com cenas desconexas. A aparição dos super-dinossauros mutantes — híbridos que parecem saídos de um filme B qualquer — chega sem aviso, sem justificativa ou coerência. Uma tentativa triste de justificar a mutação ameaça com uma sequência introdutória em minutos, mas basta — depois disso, silêncio. Todo o potencial narrativo se esvai em diários e vozes robóticas, e o espectador já sabe exatamente quem morrerá, quando, e como – enfim, os únicos sustos acontecem com a torcida para que alguém finalmente interrompa esse roteiro preguiçoso.
Enquanto isso, Steven Spielberg aparece nos créditos como produtor executivo — e a pergunta que não quer calar é: como alguém que reescreveu o cinema com Jurassic Park (1993) pode manchar sua reputação com um filme tão desastroso? A sensação é que Spielberg entregou seu legado e saiu de cena. Recomeço não carrega nem o charme nem a leveza que ele imprimia às produções nas quais se envolvia — soa mais como uma cópia mal feita do que qualquer herança digna .
O orçamento declarado foi de US$ 180 milhões, com arrecadação bilionária no fim de semana de estreia — US$ 147,3 milhões só nos EUA e US$ 318,3 milhões globalmente . O problema: esse dinheiro não se converteu em qualidade. Os dinossauros CGI lembram criaturas de videogame de console médio — transparentes, sem massa, e completamente carentes de verossimilhança. Enquanto o filme original de 1993, já com 30 anos, usou com maestria uma combinação de CGI e animatrônicos, aqui parece que ninguém pensou em mecatrônicos: os efeitos são totalmente virtuais, mal renderizados e posicionados sem preocupação com ilusão de peso ou textura real — o Reddit até já definiu como “quase parece rodando no PlayStation” .
Mesmo com Gareth Edwards, conhecido por Godzilla e Monstros, no comando, e com a cinematografia de John Mathieson tentando resgatar ambientes tropicais vibrantes, o impacto visual se perde em meio ao queixo caído do expectador diante de animações descartáveis. A sensação é que houve preguiça de planejamento ou falta de tempo de render com qualidade — especialmente ao comparar com Jurassic Park, onde Spielberg sabia dosar realismo e silêncio com maestria.
Tanto o roteiro quanto a direção parecem ter inibido qualquer tentativa de interpretação emocional por parte dos atores. Scarlett Johansson ainda consegue formular frágeis ecos de emoção em rosto bonito, mas é constantemente refreada por clichês e falas robóticas. Em entrevistas, ela admite que sua mercenária “Zora Bennett” tem um arco programado por gente que nem se preocupou em torná-la humana .
Há inclusive confusões geográficas quase infantis: o roteiro coloca a ilha a “x quilômetros da costa da Guiana Francesa”, depois argumenta que o grupo está no Suriname — onde se fala holandês — e exibe personagens falando em francês em Paramaribo. Compromisso zero com realidade: a falha do roteiro em aspectos básicos de ambientação é alarmante .
Há várias cenas que tentam reproduzir momentos icônicos do original — o T. Rex saltando sobre uma criança escondida, in loco, surge, mas agora em bote inflável; o momento de reverência a um saurópode (mas trocando o Braquiossauro por um Titanossauro). A intenção é homenagear, mas a execução é genérica: o que era tensão e awe se transforma em reprise medíocre. A crítica no Rotten Tomatoes lembra que “não evolui, apenas repete” . É reciclagem malfeita, encheria de nostalgia sem alma que reforça o sentimento de estar diante de uma farsa reflexiva — e não de uma franquia que ainda tem algo a oferecer.
É curioso que, no meio desse lamaçal narrativo e visual, exista um respiro nostálgico: a inclusão da trilha clássica de John Williams — ou melhor, versões adaptadas por Alexandre Desplat — é, sem dúvida, o melhor do filme. Integrada com elegância, especialmente nas sequências iniciais e finais, a “Jurassic Park Theme” consegue momentaneamente resgatar sensações das gerações que assistiram ao original em 1993 .
Mas não se engane: a música de Williams não é capaz de salvar o naufrágio. Serve apenas como um lembrete distante do que poderíamos ter tido. Há um certo calor nostálgico, contra todas as expectativas, que talvez esteja mantendo as bilheterias acima de zero — ainda que não salve a desprezível experiência como um todo.
Sim. Se Jurassic World já andou na corda bamba entre dinosaur movie e ridículo, Recomeço desce um degrau além: vira um filme de monstros tipo Godzilla, com híbridos grotescos chamados Distortus Rex e Titanossauros, distanciando-se completamente da premissa de “como eram os dinossauros na vida real”. Há uma explicação mínima, entregues em cerca de cinco minutos de diálogo-forçado no início — e depois o roteiro esquece totalmente o assunto
O saldo final é: narrativa vazia, personagens vazios, efeitos vazios — tudo salvo por uma trilha que nos lembra que algum dia houve magia por aqui. Mas essa centelha solitária não é suficiente para evitar que Recomeço seja o ponto mais baixo da franquia desde o fiasco mais escancarado. Os fãs dedicados — como o próprio autor que aqui escreve — podem reconhecer um reflexo de nostalgia; mas evitar a decepção requintada com o roteiro genérico e a trama feita por amadores é praticamente impossível.
Jurassic World: Recomeço não é só um filme ruim — é um marco lamentável de complacência em Hollywood: uma produção trilionária que parece feita sem paixão, engajada apenas em cash-grab, recauchutando cenas clássicas, e fingindo manter o legado de Spielberg, enquanto simultaneamente o destrói. O roteiro amador, os efeitos de videogame, os diálogos de plástico e a ambientação fantasiosa se unem em um espetáculo de vazio criativo.
O único ponto louvável é essa quase antiquíssima trilha de John Williams, que, se toca seu coração, é porque, em algum momento, alguém soube como contar uma história com maturidade, emoção e respeito pelo público. Recomeço é, infelizmente, a lembrança amarga de que nem isso basta para sustentar um filme. A maior tragédia? Esse pode ser o fim melancólico de uma saga que merece descanso — e que jamais recupere seu prestígio. A amarga conclusão: um filme que promete Renascimento mas dá sepultura à própria lenda. Uma das piores produções da saga Jurassic.
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